Margareth Arilha *
Desde a década de 80, o Brasil trabalha para reduzir o número de mortes de mulheres causadas por problemas associados ao nascimento de um filho. Porém, mesmo alinhado com os esforços mundiais, o Brasil não tem mostrado bons resultados.
De acordo com o Ministério da Saúde, a Razão de Mortalidade Materna (RMM) no Brasil, que era de 68,9 mortes para cada 100 mil nascidos vivos em 1980, caiu para 49,5 em 1986, mas subiu para 51,6 em 1996 e, em 2006, atingiu 55,1. Quando observam-se os dados por raça/cor, as disparidades são maiores: entre 2002 e 2006 a proporção de óbitos maternos de mulheres negras responde por mais da metade do total.
Esse cenário traz um quadro que intriga: 105 meninas de até 14 anos morreram por problemas relacionados à gravidez entre 2000 e 2006 (Datasus). A mortalidade materna de meninas de 10 a 14 anos corresponde a 1% (2006), e a de adolescentes de 15 a 19 anos corresponde a 15,4% (2006). É possível que parte das gravidezes que conduziram estas meninas à morte tenha resultado de um abuso sexual por homem adulto familiar.
Terrível é o fato de que meninas não possam se defender de uma gravidez indesejada com a orientação apropriada nos Conselhos Tutelares e, nos casos mais extremos, com o aborto legal. Os Conselhos Tutelares não possuem à sua disposição uma equipe que possa dar consistência técnica a seus diagnósticos. Assim, suas decisões podem estar pautadas pelas ferramentas que, em geral, possuem: convicções morais e religiosas.
O caso da menina de Pernambuco, estuprada pelo padrasto e cuja gravidez indesejada de gêmeos, aos 9 anos, foi interrompida em aborto legal, pode ser considerado paradigmático. Tratava-se de uma gestação de risco de vida e resultante de estupro. A menina de Pernambuco foi uma exceção ao conseguir realizar o procedimento em um dos apenas 60 hospitais registrados oficialmente como realizadores do procedimento de aborto legal.
Não pode ser estanque o debate sobre a pedofilia no Brasil. As meninas são privadas de uma vida livre, prazerosa e com opções para o seu próprio desenvolvimento. As reflexões acerca do combate ao abuso e à exploração sexual contra crianças e adolescentes não deveriam ser desconectadas do combate à mortalidade materna.
É justo que meninas sejam objeto de prazer de alguns e que, em nome de preceitos morais e religiosos, tenham sua infância e vida atiradas em sacrifício?
*Psicóloga e Diretora Executiva da Comissão de Cidadania e reprodução - CCR
Desde a década de 80, o Brasil trabalha para reduzir o número de mortes de mulheres causadas por problemas associados ao nascimento de um filho. Porém, mesmo alinhado com os esforços mundiais, o Brasil não tem mostrado bons resultados.
De acordo com o Ministério da Saúde, a Razão de Mortalidade Materna (RMM) no Brasil, que era de 68,9 mortes para cada 100 mil nascidos vivos em 1980, caiu para 49,5 em 1986, mas subiu para 51,6 em 1996 e, em 2006, atingiu 55,1. Quando observam-se os dados por raça/cor, as disparidades são maiores: entre 2002 e 2006 a proporção de óbitos maternos de mulheres negras responde por mais da metade do total.
Esse cenário traz um quadro que intriga: 105 meninas de até 14 anos morreram por problemas relacionados à gravidez entre 2000 e 2006 (Datasus). A mortalidade materna de meninas de 10 a 14 anos corresponde a 1% (2006), e a de adolescentes de 15 a 19 anos corresponde a 15,4% (2006). É possível que parte das gravidezes que conduziram estas meninas à morte tenha resultado de um abuso sexual por homem adulto familiar.
Terrível é o fato de que meninas não possam se defender de uma gravidez indesejada com a orientação apropriada nos Conselhos Tutelares e, nos casos mais extremos, com o aborto legal. Os Conselhos Tutelares não possuem à sua disposição uma equipe que possa dar consistência técnica a seus diagnósticos. Assim, suas decisões podem estar pautadas pelas ferramentas que, em geral, possuem: convicções morais e religiosas.
O caso da menina de Pernambuco, estuprada pelo padrasto e cuja gravidez indesejada de gêmeos, aos 9 anos, foi interrompida em aborto legal, pode ser considerado paradigmático. Tratava-se de uma gestação de risco de vida e resultante de estupro. A menina de Pernambuco foi uma exceção ao conseguir realizar o procedimento em um dos apenas 60 hospitais registrados oficialmente como realizadores do procedimento de aborto legal.
Não pode ser estanque o debate sobre a pedofilia no Brasil. As meninas são privadas de uma vida livre, prazerosa e com opções para o seu próprio desenvolvimento. As reflexões acerca do combate ao abuso e à exploração sexual contra crianças e adolescentes não deveriam ser desconectadas do combate à mortalidade materna.
É justo que meninas sejam objeto de prazer de alguns e que, em nome de preceitos morais e religiosos, tenham sua infância e vida atiradas em sacrifício?
*Psicóloga e Diretora Executiva da Comissão de Cidadania e reprodução - CCR
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