25 de nov. de 2008

Por mim, por nós, pelas outras...

O dia 25 de Novembro marca o assassinato brutal das Irmãs Mirabal. Não é difícil imaginar a vida de uma família vivendo na zona rural em Salcedo, província da República Dominicana. Quando o ditador Rafael Trujilo chegou ao poder, a família das irmãs Mirabal perdeu a casa e o dinheiro que possuía.

A certeza de que seu país seria mergulhado num caos econômico político e social motivou as irmãs Pátria, Minerva e Maria Teresa a formar um grupo de oposição ao regime ditatorial. Nascia,assim, “Las Mariposas”, como ficou conhecido o grupo das três irmãs.

A ditadura sangrenta de Trujilo, perseguiu, prendeu e torturou inúmeras vezes “as mariposas”. Donas de uma “força que nos alerta”, que “nunca seca” as irmãs Mirabal não se intimidaram e continuaram na luta. Era preciso, pelo bem da ditadura, silenciá-las. No dia 25 de novembro de 1960 “Las Mariposas” foram levadas para uma plantação de cana-de-açúcar e foram apunhaladas e estranguladas. Em fim, o silêncio necessário... Não se ouvia mais as vozes das três mulheres exigindo o fim do regime e o fim da opressão. Daí por diante, eram muitas vozes de muitas mulheres. O crime cujo objetivo era sufocar a oposição causou forte comoção popular e em 1961, Rafael Leónidas Trujilo tombou assassinado.

Hoje é o Dia Internacional da não violência contra a mulher. Violências que são praticadas dia-a-dia nos espaços públicos e privados. O dia é de luta, de indignação e reflexão. Em Pernambuco, só neste ano, foram assassinadas 268 mulheres. O encrudescimento da violência contra a mulher é constitutivo do acirramento das múltiplas expressões da questão social e da desigualdade marca constitutiva da sociabilidade do capital. São Marias, Pátrias, Minervas, Teresas, são muitos nomes, muitos rostos nesta trágica estatística.

Um dia desses lendo o jornal local, uma crônica de um jornalista me chamou atenção, mais que isso, aflorou em mim, revolta. A crônica perguntava por onde andava Fátima. Moradora das ruas do centro da cidade, Fátima era uma transeunte conhecida, pedinte, sobrevivente. Lembro de Fátima, mulher, negra e pobre, demasiadamente oprimida e explorada nesta sociedade racista, sexista, homofóbica e desigual. A crônica informava que Fátima foi acusada por um comerciante de ter praticado um pequeno furto.

Na ausência do Estado de direito, o povo faz suas próprias leis, seus códigos, tribunais. Julgada, Fátima foi amarrada num pára-choque de um automóvel e arrastada por alguns metros para todo mundo ver, presenciar mais um ato da barbárie e da prática de desumanização tão corriqueira e usual nestes dias em que a liberdade, a justiça e o humano vão perecendo. Depois desse episódio, Fátima sumiu das ruas do centro, informava a crônica de Osair Vasconcelos.

Cada uma de nós - em nossa singularidade e diversidade - temos uma história para contar sobre as formas de violência que nos atravessam e aviltam. Violências alimentadas pela herança do patriarcado. São números preocupantes que nos põem em estado de alerta, em permanente estado de tensão, pavor, nos chamando para a organização coletiva. Hoje, 25 de novembro é dia de luta pela não violência contra a mulher! Que a poesia de Gonzaguinha e a força das mariposas ecoem nestes dias nublados e alvoreça na nossa luta: “ay mi pequena florecita liberdal mariposa, vem a volar em nuestro jardim tropical, trae de nuevo la luz y el calor de um tiempo de sol...”.

Andréa Lima - Assistente Social e doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da UFPE

Um comentário:

  1. Mulher ao Espelho
    Cecília Meireles
    Hoje, que seja esta ou aquela,
    pouco me importa.
    Quero apenas parecer bela,
    pois, seja qual for, estou morta.
    Já fui loura, já fui morena,
    já fui Margarida e Beatriz,
    Já fui Maria e Madalena.
    Só não pude ser como quis.
    Que mal fez, essa cor fingida
    do meu cabelo, e do meu rosto,
    se é tudo tinta: o mundo, a vida,
    o contentamento, o desgosto?
    Por fora, serei como queira,
    a moda, que vai me matando.
    Que me levem pele e caveira
    ao nada, não me importa quando.
    Mas quem viu, tão dilacerados,
    olhos, braços e sonhos seus,
    e morreu pelos seus pecados,
    falará com Deus.
    Falará, coberta de luzes,
    do alto penteado ao rubro artelho.
    Porque uns expiram sobre cruzes,
    outros, buscando-se no espelho.

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