A JOVEM Lei Maria da Penha (11.340/06), que completa hoje seu segundo ano, desde sua sanção pelo presidente Lula, tornou-se um dos marcos legais com o mais amplo apoio da sociedade brasileira na história recente de nossa democracia. Porém, sua diferenciada aplicação em todo o território nacional indica um descompasso entre as demandas da sociedade e a Justiça, ao mesmo tempo em que coloca desafios gigantescos para todos os Poderes, bem como para toda a sociedade.A enorme acolhida que a Lei Maria da Penha amealhou em tão pouco tempo -seja pelo movimento feminista e de mulheres, seja pela imprensa, seja pelo conjunto da sociedade- agora é traduzida em números: 83% de aprovação.
Esse índice foi aferido por pesquisa elaborada pelo Ibope/Themis - Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero, com apoio da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, realizada nos dias 17 a 21 de julho, de abrangência nacional (2.002 entrevistas em 142 municípios), com margem de erro máxima estimada em dois pontos percentuais para mais ou para menos.
O levantamento buscou, primeiro, aferir o grau de conhecimento espontâneo sobre a lei. À pergunta "você conhece, ainda que de ouvir falar, a Lei Maria da Penha?" nada menos do que 68% dos entrevistados indicaram conhecê-la, contra 32% que não a conhecem/não opinaram. Importante assinalar que não houve apresentação de cartela de opções de respostas nessa pergunta. Ou seja, o entrevistador não dá nenhuma informação ao entrevistado sobre a lei. Quem responde positivamente o faz porque tem o registro da lei em sua memória.
Na seqüência da pesquisa, é fornecida ao entrevistado a informação de que a Lei Maria da Penha "define as punições e os encaminhamentos para as situações em que a mulher sofre algum tipo de violência de seu companheiro". Diante de uma cartela de opções de resposta, a ampla maioria dos entrevistados (64%) indicou que a lei ajuda a diminuir a violência doméstica e 19% acreditam que a lei "mais ajuda do que atrapalha", contra apenas 5% para os quais ela "mais atrapalha do que ajuda/só atrapalha".
Não têm opinião a respeito ou não sabem/não opinaram 12%. Em síntese, 83% do universo total de entrevistados tem uma percepção positiva da Lei Maria da Penha.Os resultados da pesquisa gritam: a sociedade brasileira quer a Lei Maria da Penha aplicada, com vigor.Há um descompasso entre a incorporação da lei pela sociedade e as medidas adotadas para sua plena aplicação. Ainda são lentas as iniciativas no âmbito dos Judiciários estaduais para criar os Juizados Especiais de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, previstos na lei. Dentre as 27 unidades da Federação, apenas 17 instalaram os referidos juizados.
Há 15 meses, a então presidente do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), ministra Ellen Gracie, por meio da recomendação nº 9, chamou a atenção dos Tribunais de Justiça dos Estados para a criação dos Juizados Especiais de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, além da adoção de outras medidas previstas na Lei Maria da Penha para a implementação de políticas públicas que visem garantir os direitos humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares.Apesar dos esforços do Poder Judiciário, como a realização de duas jornadas de trabalho sobre a Lei Maria da Penha, promovidas pelo CNJ, e da realização de cursos multidisciplinares sobre violência doméstica para capacitação de juízes especializados nos casos de violência contra a mulher, ainda é insuficiente -neste segundo ano da lei- a aceleração na criação de novos juizados.
O governo federal investiu, em 2008, somente por meio do Ministério da Justiça e da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, R$ 10 milhões no apoio à criação de novos juizados, núcleos e Promotorias especializadas no atendimento à mulher e R$ 7 milhões na criação de centros de referência, reaparelhamento de Casas Abrigo e outros serviços de atendimento à mulher que contribuem para a plena aplicação da lei.Mas a efetiva criação dos Juizados Especiais de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher dependerá da pressão social e da sensibilidade dos Tribunais de Justiça estaduais.
NILCÉA FREIRE , 55, médica, é ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República. Foi reitora da Uerj (Universidade do Estadual do Rio de Janeiro) de 2000 a 2003.
Arigo publicado na Folha de São Paulo
12 de ago. de 2008
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